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ÉTICA EMPRESARIAL

Guarulhos, 30 de julho de 2002

Quase um ano depois do fatídico 11 de setembro, a crise econômica parecia ter evaporado. No caso brasileiro com vistas às eleições, muitos colaboraram para que a crise interna se criasse.

Os especuladores em primeiro lugar, que passam a manipular o dólar como lhes convier no seu dia a dia, em segundo lugar todos os candidatos a presidente, os três de oposição por apresentarem discursos fora da realidade e tentarem a qualquer que seja o custo (sempre na nossa cabeça e a que custo para o país), ganhar a eleição. O candidato do governo por não defender com afinco suas convicções e não atacar os três de oposição.

Porque essa sensação de que a Economia não funciona? Exportamos e bem, isto nos traz divisas e empregos, produzimos de tudo, temos mercado, tendo apenas a lamentar o desemprego, que na base de 7% no país todo e 18% na cidade de São Paulo, mostra que nessa cidade os mais necessitados vem aqui se defender. O desemprego em São Paulo não é de todos os paulistas.

São sensações negativas, más vibrações, a que vivem no dia a dia muitas empresas. Cada dia aparecem notícias de despedidas de empregados. Um desempregado no meu concorrente é um problema para mim, porque ele sai do mercado consumidor, que talvez irá comprometer-me. Essas despedidas também são denominadas reestruturações.

Nesse momento alguém começa a recordar de época de vacas magras, muito distante. Está pronto o prato dos comentaristas.

Talvez uma resposta seja a inquietude que se encontra por traz dos casos Enrom e WorldComm, entre outros. São somente a ponta de um iceberg, mas depois deles tomaremos ainda este ano, conhecimento de muitos outros exemplos de má gestão, por não dizer de má intenção.

Provavelmente por aqui sairão algumas conseqüências. Os empregados de grandes, medianas e pequenas empresas se encontram imersos em um ciclo econômico que parece incontrolado, ou melhor, controlado por falta de ética e escrúpulos. Existe uma suspeita generalizada por parte dos empregados, de que seus postos de trabalhos e seus salários, dependem agora mais de uma especulação e megalomania de alguns dirigentes empresarias, de que seu esforço e dedicação no cumprimento de seus deveres com a empresa. Mais lá do que aqui. Deus é brasileiro.

Hoje estão esses empregados em uma organização, amanhã em outra organização, em função de interesses, que vá você deduzir para saber a que realidade correspondem? Estas notícias chegam do exterior, principalmente Estados Unidos. Aqui já tivemos contato com gerentes em um almoço, que nos questionavam como seria aqui. A resposta mais rápida que pude dar: “Vocês estão em uma empresa que aparenta não dar lucro fiscal, esquecem-se que ela e sólida. Apenas não registra tudo”.Coisas típicas do Brasil. Questionaram que,quando uma empresa fecha no Brasil, o dono sempre sai-se bem da situação. O que eles esqueceram é que trabalham todos os dias com jornais comerciais para executar suas funções financeiras, pricipalmente na área de cadastro de clientes, e não perceberam que isto hoje é um mito, raros são hoje os casos de falência, a não ser aquelas grandes e fraudulentas, muito bempreparadas. Eles também esqueceram-se que os fornecedores, estão atentos não fornecendo além de certos limites de crédito. Eles mesmos que são da área financeira, têm estas dúvidas?

É o medo que está na cabeça das pessoas, que não sabem como pensam seus dirigentes. Isto está muito mais propício nos Estados Unidos que no Brasil. Aqui com o controle de gastos, falta de dinheiro, todo mundo está aceso.

Será que se perdeu o rumo dos negócios. A estratégia parece na medida de duas coisas: quanto maior melhor, mais poder, mais satisfação pessoal, mas só se é possível, pensa-se em maior rentabilidade e maior projeção de segurança ao futuro. A satisfação pessoal de ser o “Número Um” tem trazido estes problemas, principalmente nos Estados Unidos, onde virar capa de revista de negócios dará uma projeção individual. Mas questiona-se – e a empresa ondefica? Casos de promoções dentro da IBM e GE são típicos. Se os detentores de cargos não examinarem bem seus sucessores, muitos problemas pela frente vão surgir. Elas foram a exceção.

As empresas são fruto da inquietude e visão de uma pessoa ou grupo de pessoas, que apostam na segurança de um posto de trabalho e o recebimento de salários e prêmios, por satisfazer a criatividade que levam dentro de si, característica inata de certas pessoas. Supõem-se, e aqui está a resposta, que esse desenvolvimento pessoal os conduzirá, ao desenvolvimento econômico, porém sempre, no caso de um verdadeiro empresário, essa é matéria de segunda ordem. O verdadeiro empresário deseja é segurança de seu empreendimento.

A diferença entre verdadeiros empresários e os”malandros” que estão aparecendo nos Estados Unidos, é que estes gestores empresariais, uma espécie que domina parte do mercado de trabalho de grandes empresas, é que eles perseguem o êxito, não desde o ponto de vista de superação e desenvolvimento pessoal, como também de uma perspectiva menos humanista. O dinheiro, o poder e a imagem acima dos interesses das próprias organizações para onde são nomeados dirigentes, e ainda ao caminho contrário das pessoas que compõe a empresa e fazem o seu real compromisso diário de cumprir suas obrigações.

Muitos grandes dirigentes apareceram, viveram o mundo dos negócios. Mas se puxarmos pela memória, veremos que o mais importante dos modernos grandes dirigentes foi Lee Yacocca, o homem que saiu da Ford depois de criar o Maverick, e levantar a empresa. Saiu e foi dirigir a falida Chrysler e também a transformou em empresa líder. Ganhou rios de dinheiro em salários e os chamados bônus, muito comum para remunerar os dirigentes que tornam as empresas lucrativas.

A partir do fenômeno Yacocca houve uma profunda transformação na procura de dirigentes, caçados a peso de ouro pelos “Hedhunters” (caçadores de cabeça), que vendo esta situação aproveitaram-se para inflacionar as remunerações dos grandes dirigentes. Estava iniciada a época do nascimento de indivíduos que só pensavam em assumir posições, nos ganhos pessoais e as empresas ficavam em segundo plano. Ganhar e a empresa em segundo plano, você perguntaria. Claro, sugavam o que podiam, depois as empresas eram adquiridas por outras, suas concorrentes ou não, normalmente empresas firmes e senhoras de si, que compraram grandes empresas, duas, três, quatro e até cinco vezes maior que elas e tocavam os negócios. Exemplo de dois ou três anos foi o da novíssima AOL (Internet), que conseguiu comprar televisão (CNN), estúdio de televisão (Warner), antes pertencente a Ted Turner, o então mago da administração.

Talvez estejamos às portas de uma mudança, de volta à ética empresarial. O caminho não é fácil, mas só requer tempo, pois os fundamentos que sustentam a mentira estão desmoronando, são inúteis para suportá-la.

Dirigentes sem esse perfil existem e serão procurados. No Brasil a situação não é assim, porque nossas empresas quase sempre são familiares, dão continuidade aos seus negócios, com a sucessão familiar. Mas não nos esqueçamos que grandes empresas multinacionais aqui radicadas, que são administradas por um corpo de autênticos e valorosos dirigentes brasileiros. Não nos esqueçamos também dos brasileiros que são recrutados para o exterior, devido suas grandes qualidades de administradores, com trabalho sério e honesto, ganhando posições como no Bank Boston, dirigido pelo Henrique Meireles e a Renault que contratou Carlos Ghosn.

Meirelles como presidente mundial do banco, o dirigia com mão forte, banco fundado em 1785, uma instituição forte e bicentenária. Ao final da década de 1990 sob o controle de Meirelles (o banco baqueou e foi incorporado por um menor Fleet), que por questões mercadológicas manteve o nome Bank Boston, mas soube visualizar que os problemas não foram criados por Meirelles, e hoje ele é o presidente mundial do grupo todo, subordinado aos dois manda-chuvas do Fleet.

Ghosn iniciou seu trabalho na Renaut e quando esta adquiriu o controle da falida Nissan, foi transferido para o Japão. Mudou a cultura, a forma de trabalho desta tradicional empresa japonesa, moldando-a nos modelos ocidentais para surpresa de muitos e conseguiu pôr a empresa em pé.

Qualidade de dirigentes temos no Brasil. Eles estão escondidos ou pressionados por outros que não os deixam ver o Sol. Grandes Universidades formadoras de administradores nós temos.Importante é considerar que a mudança começou, não em 11 de setembro, mas após a Enron e WorldComm. Um foi fato político, o outro econômico. E o futuro do Brasil, passa pelo político ou econômico? À sua apreciação.

Antonio Carlos Colnaghi é Contador, Economista e Administrador de Empresas, perito e auditor econômico, consultor de empresas no Estado de São Paulo, docente do Senac, Cape e Sebrae. e-mail: accolnaghi@ig.com.br.