Empresas começam a aprender a reter os bons profissionais
Já não basta um bom salário para reter talentos nas empresas. O executivo atual não pesa apenas a remuneração – quase todas muito próximas em cada setor, independente da empresa – na hora de decidir se aceita, ou não, mudar de emprego. Ele também prioriza liberdade de expressão, voz ativa, oportunidade de crescer e até mesmo atuar em companhias que tenham responsabilidade social.
Mas muitas empresas nem sequer sabem quem são os talentos que atuam em suas organizações. Pesquisa realizada pela Right Saad Fellipelli, multinacional de recursos humanos, com cerca de 300 executivos de diversas áreas de atuação em empresas brasileiras mostrou que, em 27,59% das companhias, não há nenhum programa para reter seus bons executivos. Em 20,69% delas existe esta preocupação, mas não há recursos formais.
No restante das empresas pesquisadas (51,72%), os resultados indicam maior atenção em não perder executivos com alto potencial. Mas somente em 13,79% há um programa formal para preservar talentos. Nas demais – 37,93% – este programa está em implantação. Boa parte dessas empresas são multinacionais, cerca de 75% das entrevistadas, cuja média de faturamento está entre US$ 400 milhões e US$ 600 milhões.
A Volkswagen é uma delas. Dos R$ 14 milhões investidos em 2001 em treinamento dos empregados no Brasil, R$ 2,5 milhões foram destinados aos 800 profissionais que a empresa considera seus talentos e que foram cadastrados nos últimos três anos.
Carlos Augusto Costa da Silva, gerente da área de desenvolvimento de recursos humanos da Volkswagen, conta que a empresa sempre se preocupou com o desenvolvimento de seus profissionais, mas que em certo momento precisou concentrar energia em seu processo de sucessão. “São esses talentos que vão trazer as grandes mudanças e gerenciar a empresa no futuro”, diz. “Por isso, é importante saber quem eles são e acompanhá-los nesse processo.”
Para o executivo, não existe uma fórmula na companhia para reter talentos. Seu “programa” está baseado em ações. A primeira é identificar os profissionais em um banco de talentos, divididos por diretoria. Depois, avaliá-los em relação às suas competências.
Aos talentos identificados, é oferecida a chance de liderar equipes e projetos para ver como se comportam. Eles podem participar de cursos de especialização e programas de desenvolvimento no Brasil e exterior.
Margareth Ribeiro, consultora de organização da Volks, acaba de voltar de um programa em que passou mais de um ano na Alemanha. Aos 30 anos, ela fez curso de especialização e de línguas, 100% pagos pela Volks. “A empresa oferece a possibilidade de desenvolvimento profissional”, diz a executiva, que recebeu convites com melhores salários e cargos superiores, mas preferiu permanecer na multinacional.
Na percepção de 44,83% dos altos executivos entrevistados, a empresa em que trabalham possui menos de 10% de profissionais com perfil de talento, e 37,93% acreditam que de 11% a 30% da força de trabalho sejam altos talentos. Dos entrevistados, 13,79% acham que de 31% a 60% dos profissionais possam ser considerados talentos e 3,45% acreditam que existam mais de 61% em suas empresas.
Para 32% dos executivos entrevistados, o programa de carreira está em implantação e o mesmo percentual acha que há este programa em suas empresas, em algumas atividades e aplicados quando solicitados. Dos pesquisados, 28% consideram que existe um projeto em desenvolvimento e 8% não tem informação.
Miguel Vizioli, sócio da Right do Brasil, conta que os profissionais jovens ingressam no mercado com a preocupação de se aprimorar, o que mostra que sobra mão-de-obra especializada. Por isso, as empresas não precisam disputar esses profissionais, dispensando os programas de retenção de talentos. “A mentalidade entre os líderes empresariais é ?se não serve, troca?”, diz Vizioli. “Quando esse pessoal qualificado for escasso, as empresas que não estiverem preparadas para retê-los terão problemas”, completa.
No banco Real ABN Amro os talentos são indicados por membros do comitê de carreiras, criados no Brasil em 1999, quando o banco Real foi adquirido. Logo identificado, o profissional apresenta seu plano de carreira e o discute com o superior de seu chefe, “que tem uma visão mais ampla e permite uma relação menos constrangedora do que o chefe direto”, diz Fernando Lanzer de Souza, diretor de RH.
O banco de talentos é tão importante para a instituição, que o presidente mundial cobra indicações para serem disponibilizadas no data base mundial. “Gerenciar esses talentos não é um serviço de RH, mas dos próprios executivos”, diz Lanzer. Dos 140 talentos listados no Brasil, sete trabalham atualmente em Amsterdã, Holanda, sede do ABN.
O banco tem como política não cobrir contrapropostas. “Não seguramos ninguém com dinheiro, mas com a possibilidade de aprender e crescer aqui”, afirma Lanzer. Ele conta que o aprendizado é o principal atrativo, seguido pela ética praticada no banco. “Os talentos querem se identificar com os valores da empresa”, diz.
Na Nortel Networks, empresa de alta tecnologia, recursos humanos é estratégico. Com alto investimento em pesquisa e atuando em um setor competitivo, talentos são fundamentais. Por isso, a subsidiária brasileira está atenta a programas de retenção de talentos. Além de identificar esses profissionais, o programa avalia e planeja a carreira e faz a classificação pela habilidade, conhecimento e experiência.
Os instrumentos utilizados variam dos benefícios – bônus ou “stock options” – até viagens e reconhecimento público. Mas o que realmente retém os talentos, na opinião de Fernando Lima, diretor de RH da Nortel, é um conjunto de oportunidades: proposições de valores da empresa, oportunidades de treinamento, plano de carreira e o livre acesso aos superiores e pares.
Além disso, os funcionários podem se candidatar a vagas em qualquer lugar do mundo. “São oportunidades sem limites que nos permitem não perder nossos talentos para a concorrência”, diz Lima. A Nortel guarda na manga uma estratégia diferente para manter seus profissionais mais qualificados. Pergunta a eles qual seria a oferta que não recusariam. As respostas são analisadas e, se consideradas viáveis e realistas, são postas em prática. “Antecipamos essas condições antes mesmo do executivo ser assediado”, diz.
Na multinacional francesa Rhodia, a política de retenção de talentos é baseada em programas de expatriação. Atualmente, 45 executivos brasileiros estão no exterior. “O programa não é elitista: qualquer um pode se candidatar”, diz Osni de Lima, diretor de RH da Rhodia para a América Latina.
O programa funciona desde o início das operações da companhia no Brasil e as vagas são divulgadas na intranet mundial da empresa. Os executivos contam ainda com plano de pensão com participação da empresa e recebem até 80% de ajuda no pagamento de cursos de aperfeiçoamento direcionado à carreira.