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Alma do negócio é publicidade popular

Guarulhos, 25 de abril de 2002

As paredes do escritório do publicitário Bá Assumpção são repletas de quadros com o significado da palavra popular em diversos idiomas. Lá, funciona a sede da Popular Comunicação, de São Paulo, primeira agência de grande porte do País que trabalha, exclusivamente, com campanhas voltadas para os consumidores de baixa renda. A lógica é de que nenhum produto ou serviço pode ser líder de mercado sem liderança entre as classes C, D e E. A aposta nas vendas para o povão é alta. A meta da Popular é estar entre as dez maiores agências brasileiras em cinco anos. A Popular tem outros dois sócios, João Augusto Neto e Wagner Sarnelli. Veja o que Assumpção diz sobre o mercado publicitário popular.

As classes populares representam 80% da população brasileira. São mais de 54% dos consumidores do País. Não existe um mercado desse tamanho em outro lugar do mundo. São comportamentos muito específicos, com grande potencial de crescimento, pouco explorados pelas agências de publicidade no Brasil. É impossível fazer propaganda para o povo brasileiro de dentro das salas fechadas, lendo recortes de jornal. Todas as semanas, passamos 30% do nosso tempo na rua, fazendo pesquisa de campo em locais como favelas e bairros mais afastados do centro. Sabemos onde moram todos os chefes de família nordestinos estabelecidos em São Paulo com renda entre 7 e 15 salários mínimos. Somos capazes de aplicar trabalhos tão específicos quanto ações de marketing direto na Favela da Rocinha.

O Brasil trata mal quem não tem dinheiro, esquecendo o fato de que as classes C, D e E são as que mais empregam seus recursos em consumo. Nesses casos, cada aumento na renda é acompanhado de uma ampliação nos bens consumidos. Desde o início, sabíamos que haveria preconceito das agências que fazem campanhas para a classe A em torno da proposta da Popular. Ficamos conhecidos como os publicitários dos pobres. O nosso trabalho põe o mercado publicitário em questão. As grandes marcas estão perdendo espaço. Elas se distanciaram da maior parte dos seus consumidores. A publicidade não acompanhou as mudanças desse mercado. No último ano, 85% dos compradores de bebidas trocaram de marca. O mesmo aconteceu com 74% das pessoas no setor de alimentos e 65% no ramo de higiene pessoal. Os consumidores de baixa renda movimentam 58% de produtos de higiene e cuidados pessoais, 64% do consumo de alimentos e remédios ou 51% dos vestuários e calçados. É preciso estar atento e entender essas características dos consumidores de menor poder aquisitivo.

Nos últimos anos, a Seda ganhou a liderança do mercado de xampus oferecendo produtos para todos os tipos de cabelos, incluindo os cabelos crespos. Foi só descobrir o óbvio, só perceber que os brasileiros são do jeito que são: do liso ao crespo. Jack Welch costumava dizer que passou a vida inteira ensinando seus executivos a trabalhar com a realidade como ela é, não como eles gostariam que fosse. O Brasil é o país das classes C, D e E. Nem todo mundo sabe, mas o povo é extremamente sábio em suas decisões de consumo. Numa das pesquisas de campo que realizamos junto com o Instituto Data Popular, ligado à agência, ouvi de uma senhora de Itaquaquecetuba que “o real é bom, mas é um dinheiro difícil de ganhar”. Essa é a lógica. Ninguém quer jogar dinheiro fora. Mesmo num país rico, como os Estados Unidos, ninguém arredonda troco, ninguém desperdiça. Imagine então para quem vive sob um orçamento apertado. A renda precisa ser aplicada naquilo que vale a pena. Marcas líderes como Omo, por exemplo, são sucessos de venda mesmo sendo mais cara que a média exatamente por esse motivo. O consumidor de classe C, D e E não pode arriscar comprando o sabão em pó que não atende suas expectativas. Não dá para comprar outra embalagem se a primeira marca não deu certo. A estabilização da moeda trouxe mudanças profundas nos hábitos de compra desses brasileiros. Quem não perceber sutilezas, como essa, estará fora do mercado.

O Data Popular realizou uma pesquisa para uma indústria nacional de cosméticos sobre o mercado popular de produtos de higiene e beleza para bebês. A equipe escolhida para o trabalho conviveu com mães das classes populares e descobriu que, ao contrário do que se possa imaginar, todas têm acesso a categorias de produtos caros, como o algodão colorido e as fraldas descartáveis. As marcas encontradas nas casas eram, normalmente, as mais famosas de cada modalidade, mesmo que o espaço fosse dividido, em algumas situações, com as chamadas marcas talibãs. Todos os segmentos do mercado podem aprimorar seu desempenho observando os hábitos e preferências das classes populares. A casa própria, por exemplo, é o bem de consumo mais desejado dos brasileiros. Independente da renda. Entre as classes C, D e E, a compra do imóvel é feita por impulso na maioria dos casos. Poupar durante anos para dar entrada na casa é uma possibilidade remota para as famílias nessa faixa. O orçamento não permite. O segredo é oferecer condições de compra sob prestações acessíveis à renda de cada família. Todos farão apertos aqui e ali para sair do aluguel. Na campanha do Plano Minha Casa, do Banco PanAmericano, a comunicação com os consumidores foi toda baseada em expressões como “vai que dá” ou “você e sua família merecem, ligue agora”. O aval de alguma instituição conhecida e confiável é outro ponto importante para convencer as pessoas a adquirir o primeiro imóvel dessa forma. São estratégias assimiladas na fonte, direto dos consumidores.

Isabela Barros