Crise argentina favorece empresas do Brasil
As empresas brasileiras poderão ser beneficiadas com a nova fase de “estrangeirização” das empresas argentinas. É o que afirma o economista e ex-diretor do Banco Central, Júlio Piekarz, da consultoria IBCP.
As provas, na sua opinião, são a AmBev, que anunciou, em maio, aliança com a Quilmes, e agora a compra de 58,6% da holding Perez Companc pela Petrobrás.
“Tudo dependerá, no entanto, da estratégia de cada empresa e do cálculo que façam entre o nível de desconfiança existente hoje na Argentina e o futuro de seus investimentos”, diz Piekarz.
“A desvalorização realmente acaba favorecendo as empresas estrangeiras”, admite o secretário-geral da Presidência da República, Aníbal Fernandez, sem citar especificamente as brasileiras, únicas a anunciarem investimentos na Argentina este ano.
Cautela
No governo brasileiro e no chamado Grupo Brasil, que representa 190 empresas brasileiras na Argentina, ainda impera a cautela.
“Não significa que vamos sair comprando qualquer empresa argentina, devido à desvalorização do peso e às dívidas que hoje acumulam e ajudam para contribuir para a queda de seus valores”, afirma um empresário brasileiro que investe na Argentina desde 1996.
Mas estima-se que, com a compra da Perez Companc, subiram para cerca de US$ 10 bilhões os investimentos do Brasil no país.
Antes da desvalorização, a estimativa era de US$ 8 bilhões.
Mas tanto na Petrobrás quanto na Ambev, argumenta-se oficialmente que a desvalorização do peso contribuiu, mas não foi o único motivo que levou à oportunidade dos negócios.
“A Ambev já estava de olho na Quilmes há mais de dois anos”, conta o diretor institucional da cervejaria argentina, Fernando Lascano.
“A Petrobrás quis, primeiro, a Repsol-YPF (primeira petroleira no ranking argentino), mas esta não queria conversa. Então, pensamos na Perez Companc e realmente surpreendemos o mercado”, observa um interlocutor da Petrobrás argentina.
Desde o ano passado, a empresa brasileira de petróleo é dona de 700 postos da marca EG3, negócio que fez numa troca de ativos, de US$ 1 bilhão com a Repsol-YPF.
Mudança de imagem
Para o Grupo Brasil, a mudança da imagem dos empresários brasileiros, segundo pesquisa da Hugo Haime e Associados, divulgada na semana passada, também contribuirá para que novos negócios sejam realizados na Argentina.
“A nossa única preocupação é com a imagem da Petrobrás. Será que essas sucessivas críticas ao nosso anúncio de compra acabará prejudicando nossos planos de expansão?”, questionava-se um assessor da estatal na Argentina.
Se o negócio for realmente ratificado em setembro, como está marcado, a Petrobrás passará a ser a segunda petroleira do país.
“Pelo menos nos próximos tempos, enquanto a Argentina estiver na lista negra da desconfiança, somente as empresas exportadoras, e bem situadas, vão atrair compradores”, analisa Piekarz.
“Com a queda do PIB de mais de 16% no primeiro trismestre deste ano, frente ao mesmo período do ano passado, ninguém pode ter ânimo para apostar em uma empresa voltada apenas para o mercado”.
Mau sinal
Para o presidenciável Ricardo Lopez Murphy, conhecido dos economistas e do governo brasileiro, não importa a nacionalidade do comprador das empresas argentinas.
“Para mim, a venda da Perez Companc para a Petrobrás é um mau sinal. Se uma holding poderosa como essa tomou tal atitude, o que poderemos esperar das outras?”, indignou-se.
A Perez Companc é um dos últimos seis grandes grupos nacionais em uma lista dos trinta maiores do país.
Na opinião de Eloi Rodriguez de Almeida, presidente do Grupo Brasil, está ocorrendo uma “reacomodação” dos investimentos brasileiros na Argentina.
Isso porque setores como o de frango – caso da Sadia – optaram por deixar seus investimentos no país, limitando-se ao papel de exportador.
O mesmo ocorre com sapatos. Nos dois casos, a justificativa é a mesma: a desvalorização do peso, que provocou a queda de cerca de 50% nos preços argentinos, deixou seus produtos menos competitivos.
Marcia Carmo