A valorização de cerca de 22% do dólar frente ao real este ano leva o comércio de importados a repensar estratégias. Empresas de diferentes setores procuram agora centralizar as compras nos itens de maior saída. Na tentativa de evitar uma queda ainda maior na procura pelos produtos, lojas e importadoras de itens como alimentos e mercadorias em geral – de martelo a peças de roupa -, tratam de absorver grande parte dos custos do aumento do dólar. Outros segmentos, como o de cosméticos, não conseguem arcar com o custo adicional e transferem para o consumidor toda a alta do câmbio.
A desvalorização do real também ameaça as vendas das chamadas lojas R$ 1,99, hoje menos características porque exibem produtos de maior valor. A substituição de importados por similares nacionais, nesse caso, não funciona, segundo os comerciantes. É que boa parte dos produtos importados de baixo valor vem da China. Desta forma, ainda são mais baratos se comparados com as mercadorias nacionais semelhantes.
Abaixo do custo
“O mercado de R$ 1,99 ainda sobrevive porque os produtos vendidos por este valor já foram mais caros um dia”, afirma o gerente de compras da Miami Discount, Leandro Tavares. Vasos, lanternas e ferramentas, entre outros produtos das lojas de R$ 1,99, são negociados por preços superiores em determinadas épocas, como Dia das Mães e Natal. “Passadas essas datas, são praticamente descartáveis e em momentos de alta do dólar são vendidos por preços menores do que os de importação.” A Miami Discount, dona de seis lojas em São Paulo, sentirá os reais efeitos da desvalorização do real na próxima semana, quando fará uma nova encomenda da China. “Decidimos absorver todo o aumento, condição para tentar evitar queda nos negócios.” As lojas são especializadas na venda de produtos com preços entre R$ 1,99 e R$ 25. A Miami reduziu a importação de produtos como eletroeletrônicos, que possuem margens menores e elevou a venda de acessórios para vestuário, como meias e luvas.
Tavares diz que a Miami não pensa, pelo menos por enquanto, em substituir produtos importados por nacionais como forma de tentar manter as margens. “Ainda é mais barato importar materiais feitos com resina, papelaria e material escolar do que comprar da indústria local”, afirma. Tavares observa, ainda, que as próprias fabricantes nacionais sentem o impacto da desvalorização cambial, de forma que seu preço também sobe.
Baixas margens
Para as importadoras de cosmético, os negócios estão bem mais difíceis. A Harty Comercial registrou queda de vendas de 15% em cada um dos últimos dois meses na comparação com os anteriores. Além da alta do dólar, a greve dos fiscais Receita Federal prejudicou a entrada dos produtos no mercado. As baixas margens operacionais impedem que a empresa, importadora de cosméticos de oito marcas norte-americanas, entre elas Helene Curtis e John Frieda, consiga absorver o aumento do dólar. A Harty tem dado preferência à compra de cosméticos mais baratos e de lançamentos internacionais, mas a estratégia ainda não surtiu efeito. “Os produtos importados ficaram muito caros para o mercado. Está difícil competir com os domésticos”, afirma um diretor da empresa. A queda das vendas, no entanto, ocorre desde 1999. Os volumes comercializados já foram 40% superiores aos de agora, que resultam em faturamento mensal de R$ 1 milhão.
Grande prejuízo
A Tradbras, importadora de alimentos japoneses, também decidiu absorver a maior parte do custo adicional de importação, porque o faturamento mensal caiu 20%, para US$ 150 mil/mês, em relação ao ano passado. “Neste momento em que de incertezas na economia nacional, o consumidor não está preparado para pagar mais”, afirmou o diretor de importação da Tradbras, William Carlos Ishiy. A empresa teve suas margens fortemente afetadas. “Fechamos o câmbio 110 dias após a compra da mercadoria. Os últimos vencimentos representaram grande prejuízo para a empresa”, diz Ishiy. A saída em curto prazo será o fornecimento de produtos como embalagens para sushi, alimentos e bebidas como o saquê para grandes redes de supermercados. A Tradbras assinou recentemente um contrato de venda de bebidas para o grupo Sonae. Wal-Mart, Carrefour e Pão de Açúcar também fazem parte de sua carteira de clientes. “Os volumes ainda são pequenos”, lamenta Ishiy.
Pequenos estabelecimentos que têm as classes média e alta como público ainda conseguem se manter. É o caso da Ohashi Comércio de Gêneros Alimentícios. O proprietário, Élcio Kohigashi, afirma que a regra é comprar apenas os produtos que saem imediatamente e deixar de lado os que agradam a poucos. “São aqueles que os preços não influenciam na compra.” Do total vendido na loja, 60% é importado.