Perdas e danos
A decisão do Banco Central de antecipar para a semana passada o ajuste das cotas dos fundos de investimento – o prazo era setembro – provocou nervosismo e acentuou a avalanche nos valores dos títulos públicos. A medida criou um clima de desespero entre os investidores que aplicam nesses papéis. A confusão está afetando até mesmo os analistas de mercado, que ainda não chegaram a um consenso sobre que orientação dar aos clientes que aplicaram suas economias nos fundos DI, até então considerados uns dos mais seguros. Tirar ou deixar o dinheiro?
Diante de tantas incertezas, os investidores sacaram R$ 1,929 bilhão desses fundos apenas na sexta-feira passada, 31 de maio, primeiro dia útil após o anúncio das alterações promovidas pelo BC. Segundo dados da Associação Nacional de Bancos de Investimento (Anbid), durante todo o mês de maio foram sacados R$ 2,68 bilhões. Ou seja: a sexta-feira foi um dia de correria atípica para retirar o dinheiro dos fundos.
De concreto, até agora, só há a percepção de que esses investidores já perderam e continuam perdendo dinheiro. Primeiro, porque o BC mandou que os gestores de fundos ajustassem as cotas dos clientes ao valor da negociação dos títulos no mercado, o que gerou um reajuste para baixo, já que os papéis vinham sendo negociados com deságio. Segundo, porque a surpresa causou ainda mais nervosismo no mercado.
Títulos já estavam caindo – Mas o que poderia estar por trás da desvalorização dos títulos públicos? O analista de renda variável do BNL Asset, Marcelo Afonso, lembra que as Letras Financeiras do Tesouro (LFTs) – principais títulos públicos que compõem as carteiras dos fundos de renda fixa – já vinham despencando desde março. O governo tinha uma grande dívida cambial e não queria rolar esse débito com a emissão de novos papéis também cambiais. A saída foi oferecer ao mercado leilões casados de títulos públicos com uma correção pela variação do dólar.
Numa operação de troca (swap cambial), os bancos desmembravam o papel em dois, ficavam com a correção cambial e revendiam os títulos públicos, o que provocou uma enxurrada desses ativos no mercado e a sua conseqüente desvalorização.
Com a proximidade das eleições e as incertezas em relação a uma possível renegociação da dívida brasileira, poucos investidores querem agora manter títulos de longo prazo em suas carteiras. De acordo com um analista de mercado, este fator, entre outros, está causando a recente queda no valor desses papéis.
– Ninguém quer ficar com papéis de longo prazo. A dívida do governo brasileiro é grande e os bancos têm receio de que haja uma renegociação da dívida. E uma renegociação é sempre imposta – lembra um analista, destacando que esse assunto faz parte do discurso dos principais candidatos à Presidência da República.
E agora? – Que o estrago já está feito, ninguém discute. A pergunta é como agir. O vice-presidente da Thomson Financial Brasil, Henrique Garcia Spinosa Netto, diz que sacar os recursos dos fundos DI é a pior forma de se perder dinheiro no momento.
– Não dá para sair de um ativo que está muito barato e comprar outros que estão muito caros, como o dólar, por exemplo.
Ele lembra que o BC já parou de fazer leilões de swap cambial e que a tendência é de que o mercado de títulos públicos fique mais enxuto. Além disso, destaca, o BC tem se esforçado para evitar a desvalorização dos papéis: nesta quarta-feira, ofereceu ao mercado títulos com vencimento em 2003 em troca da recompra de papéis com um prazo mais longo, que estão sofrendo mais com as turbulências.
Spinosa Netto destaca ainda que os investidores que mantiverem seus recursos aplicados até o vencimento dos papéis não deverão ter perdas, já que este tipo de ativo tem uma rentabilidade pré-estabelecida. Mais cético, outro analista diz que não há garantias de que as regras do jogo não possam ser alteradas. Ele lembra que o cenário é de nervosismo e que a percepção de risco do país está agravada pelas indecisões no cenário eleitoral:
– Ninguém sabe o que pode acontecer. Quem não está disposto a ter qualquer tipo de perda deve diversificar seus investimentos. Aplicar tudo em ativos que tenham o máximo de liquidez e o prazo mais curto possível. Investir um pouco em dólar, um pouco em ações e até mesmo na poupança – recomenda.
Na terça-feira, a média de remuneração do CDI, que serve como base para os fundos de investimento, foi de 13,5%, contra uma média de remuneração de 9% da caderneta de poupança. Este analista, no entanto, não acredita que as taxas de remuneração dos empréstimos feitos entre os bancos continuem num patamar tão baixo.
Juliana Rangel